Com mais de 1 milhão de casos prováveis de dengue notificados neste ano em Minas Gerais, dos quais 479.958 foram confirmados até o dia 19/4, a pior epidemia de arboviroses já registrada no estado desde 2010 foi tema de videoconferência envolvendo a Coordenadoria de Vigilância em Saúde da Superintendência Regional de Saúde (SRS) de Montes Claros, acadêmicos e professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). A videoconferência foi conduzida dia 23/4 por professores da disciplina doenças infecciosas e parasitárias, com a participação de Agna Soares da Silva Menezes, coordenadora de Vigilância em Saúde e do Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (Cievs) na SRS.

Entre algumas das conclusões do evento, foi evidenciada a necessidade da integração de ações entre as instituições de ensino superior e de pesquisa com a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) para o desenvolvimento de ações conjuntas voltadas para entender as mudanças do cenário das arboviroses. Os profissionais avaliam que, além do mosquito Aedes aegypti já ter criado resistência a inseticidas aplicados com a utilização de equipamentos de Ultra Baixo Volume (UBV) veicular, estão ocorrendo mudanças nas manifestações clínicas das doenças, com aumento da gravidade dos sintomas, prolongamento do tempo de recuperação dos pacientes e ocorrência de óbitos envolvendo pessoas mais jovens e sem comorbidades.

25.05.2024-Montes Claros-videoconferência arboviroses

Ao apresentar a situação epidemiológica do estado, Agna Menezes lembrou que neste ano Minas Gerais enfrenta um cenário até então nunca registrado. A coordenadora explicou que, entre o final de fevereiro e início de março houve um pico de mais de 120 mil casos de dengue notificados no estado em apenas uma semana. O pico mais alto até então registrado foi de 40 mil casos em uma semana. 

“Atualmente estamos com mais de 1 milhão de casos de dengue notificados em Minas Gerais, dos quais mais de 479 mil já foram confirmados por meio de exames laboratoriais. Além disso, neste ano o estado contabiliza mais de 8,2 mil casos de dengue grave; 280 óbitos confirmados e 715 em investigação”, pontuou Agna Menezes.

Apesar de ter ocorrido a redução do número de casos notificados de dengue em Minas Gerais nas últimas quatro semanas, a incidência continua alta, com mais de 500 casos por 100 mil habitantes em grande parte dos municípios mineiros, ponderou Agna Menezes.

Com base em dados repassados ao Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde pelos municípios, a coordenadora observou que, no Norte de Minas, apenas Verdelândia apresenta média incidência de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti. Os demais 85 municípios estão com alta ou muito alta incidência.

Por outro lado, de um total de 73.741 casos de dengue notificados neste ano no Norte de Minas, 16.243 casos foram confirmados por meio de exames laboratoriais. Ocorreram 258 casos graves de dengue ou com sinais de alarme; 18 óbitos foram confirmados e 19 estão em investigação. Os municípios com óbitos confirmados são: Montes Claros e Januária (5 casos em cada localidade); Bocaiuva (3); Engenheiro Navarro, Salinas, Pirapora, Várzea da Palma e Buritizeiro (um óbito em cada município).

O cenário das arboviroses neste ano no Norte de Minas também aponta que 96% dos casos de dengue notificados em 54 municípios da área de atuação da SRS Montes Claros tiveram como causa o sorotipo 1 (96%) e o restante o sorotipo 2. Porém, por meio de isolamento viral, foi detectada a circulação do sorotipo 3 da dengue no município de Salinas.

Quanto à chikungunya, até o dia 19/4,  o Norte de Minas contabilizou 2.845 casos notificados e 478 confirmados. Já em relação à zika, há 37 casos prováveis da doença na região, dos quais 2 foram confirmados.

Agna Menezes lembrou que o Norte de Minas ainda não foi contemplado com o recebimento da vacina contra a dengue. “A vacina abre boas perspectivas para o controle da doença no país, mas o trabalho de controle da proliferação de focos do mosquito Aedes aegypti por parte dos municípios e a mobilização da população continua sendo de fundamental importância. Isso porque, além da dengue, chikungunya e zika, o mosquito transmite outras doenças”, frisou a coordenadora durante a videoconferência.

Para que novas estratégias sejam definidas para o enfrentamento das arboviroses, a coordenadora do Cievs defendeu que a integração do trabalho das universidades com outras instituições de pesquisa, serviços municipais de saúde e a SES-MG constitui uma necessidade e iniciativa importante no sentido de fortalecer a troca de conhecimentos, o aprofundamento de pesquisas e a mobilização da população para o enfrentamento do desafio de mantermos as arboviroses sob controle. 

“A integração de esforços também poderá viabilizar a intensificação do trabalho de capacitação dos profissionais de saúde, com o reforço da disseminação dos protocolos clínicos que precisam ser seguidos visando a redução de óbitos que podem ser evitados", concluiu Agna Menezes.

 

Integração de ações

O médico e professor da Unimontes, Sílvio Fernando Carvalho, destacou que as autoridades sanitárias estão fazendo o possível para disseminar as condutas e os protocolos que devem ser seguidos pelos profissionais de saúde para o atendimento de pessoas acometidas por doenças transmitidas pelo Aedes aegypti. Porém, caso as recomendações estivessem sendo seguidas, desde a adoção de medidas preventivas, diagnóstico e condução correta dos atendimentos clínicos, muitas mortes seriam evitadas. “Com 40 anos de profissão percebo que falta conhecimento por parte de profissionais de saúde sobre os protocolos que devem ser seguidos, o que coloca em risco a vida de pacientes, bem como a própria condição jurídica do profissional”.

Já a professora Ana Paula Venuto observou que o quadro clínico de pacientes acometidos por alguma das arboviroses tem se agravado devido a mutações dos vírus dentro de um mesmo sorotipo. “Percebemos que a situação clínica tem evoluído para quadros de gravidade com maior rapidez, o que configura mudança de padrões da doença”.

Na mesma linha de raciocínio, a professora Mariléia Chaves Andrade destacou a importância do aprofundamento de estudos sobre as mudanças que o cenário das arboviroses tem acarretado à população. 

Segundo a professora, o quadro de evolução das doenças tem mudado, passando os pacientes a ficarem mais tempo debilitados, com agravamento de sintomas, inclusive intestinais. “Aprofundar os estudos a partir de dados coletados pela SES-MG e dos serviços municipais, nos períodos pré e pós epidemia, poderá nos ajudar a entender o motivo do aumento das susceptibilidades do ser humano aos patógenos”, reforçou Mariléia Andrade.

Por sua vez, a professora Thallyta Maria Vieira lembrou da importância da integração do trabalho dos serviços municipais de vigilância epidemiológica e de saúde com os profissionais da atenção primária.

“O trabalho conjunto dos agentes comunitários de saúde com os agentes de controle de endemias constitui medida eficaz para que os municípios consigam desenvolver um bom trabalho de vigilância ambiental, com eliminação de focos de proliferação do Aedes aegypti e acompanhamento das condições de saúde da população”. Thallyta Maria Vieira ressaltou ainda que iniciativas como essa são importantíssimas para a multiplicação do trabalho que precisa ser executado pelos municípios, com o envolvimento direto da população. 

Por Pedro Ricardo / Foto: Pedro Ricardo/SRS de Montes Claros