Apesar de ser uma doença de fácil detecção e com cura, a sífilis ainda representa um dos principais desafios da saúde pública mundial, afetando cerca de 8 milhões de pessoas por ano. Para reforçar ações de enfrentamento da doença, a Superintendência Regional de Saúde (SRS) de Montes Claros promoveu, nesta quarta-feira (4/6), uma capacitação no auditório do Serviço de Atenção Especializada (SAE) Ampliado do município.
O encontro teve como público-alvo referências técnicas dos 86 municípios que integram a macrorregião de Saúde do Norte de Minas e teve como objetivo fortalecer as ações da Atenção Primária à Saúde, especialmente no que diz respeito à testagem rápida em gestantes. A estratégia visa o diagnóstico precoce da sífilis ainda no primeiro trimestre da gestação, contribuindo para a redução da transmissão vertical da doença.
A sífilis pode ser transmitida por meio de relações sexuais desprotegidas, transfusão de sangue contaminado, uso de seringas ou agulhas infectadas e, principalmente, da mãe para o bebê durante a gestação, parto ou amamentação. O tratamento, com antibiótico à base de penicilina, deve ser estendido às parcerias sexuais, com acompanhamento clínico e laboratorial.
Segundo a referência técnica da SRS de Montes Claros, Adriana Barbosa Amaral, o cenário epidemiológico da região é preocupante. “A taxa de sífilis adquirida passou de 422 casos por 100 mil habitantes em 2020 para 1.334 em 2024. Mesmo sendo uma doença exclusiva do ser humano, com diagnóstico simples e tratamento eficaz, o enfrentamento da sífilis ainda é um grande desafio para os serviços de saúde da região”, afirmou.
Panorama regional
De acordo com dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), o município de Montes Claros concentra 58% dos casos de sífilis adquirida no Norte de Minas, seguido por Pirapora (7,55%) e Várzea da Palma (5,57%). A maior parte dos casos ocorre entre homens (60,5%), especialmente jovens de 20 a 29 anos (44%). Ainda segundo os dados, 97,7% dos pacientes residem em áreas urbanas e 47% têm ensino médio completo.
Entre gestantes, o número de casos também apresenta crescimento. Em 2020 foram registrados 313 casos confirmados; em 2023, esse número subiu para 452. Os casos se concentram, principalmente, em Montes Claros (38,89%), Janaúba (5,20%) e Pirapora (4,35%). A maior parte das gestantes afetadas está na faixa etária de 20 a 29 anos. Apenas 50% recebem o diagnóstico no primeiro trimestre da gravidez e 45,39% dos parceiros não são tratados, o que favorece a reinfecção.
“Em 34% dos casos de sífilis congênita, o diagnóstico é feito apenas no parto ou no pós-parto, o que revela falhas na detecção precoce durante o pré-natal”, alerta Adriana Amaral. Ela também destaca que 54% dos tratamentos não são conduzidos de forma adequada, contribuindo para a taxa de 11 casos de sífilis congênita para cada mil nascidos vivos – índice superior à média estadual e nacional.
Entre os fatores que contribuem para esse cenário, Adriana aponta a falta de informação da população, as desigualdades no acesso aos serviços de saúde, as dificuldades para diagnóstico e tratamento precoce e o estigma relacionado às Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), que ainda afasta muitas pessoas da busca por atendimento.
Qualificação profissional
A capacitação dos profissionais de saúde foi apontada como uma das principais estratégias para reverter esse quadro. “A atualização constante é fundamental para ampliar a capacidade de diagnóstico precoce, interpretação de exames e condução adequada do tratamento, tanto em gestantes quanto em seus parceiros”, reforça Adriana Amaral.
Durante o evento, a médica infectologista pediátrica Lara Jhullian Tolentino Vieira, do SAE Ampliado de Montes Claros e integrante da Força Estadual do SUS, abordou o manejo clínico da sífilis congênita. “É inaceitável que uma doença com tratamento e cura continue impactando tantas crianças por falta de diagnóstico precoce. A atuação qualificada dos profissionais da atenção primária é essencial para a prevenção da transmissão vertical da sífilis”, destacou.
A enfermeira Thaís Emanuely de Freitas Teixeira ministrou palestra sobre o matriciamento dos casos diagnosticados, enquanto a coordenadora do SAE, Josiane dos Santos, ressaltou que o tema será foco do primeiro ciclo de capacitações descentralizadas a ser promovido nos próximos meses. A proposta é que as referências técnicas repliquem os conhecimentos para demais profissionais de seus municípios.
Hospitais de referência
Como parte do Plano Estadual de Enfrentamento à Sífilis, a SES-MG, por meio da Resolução nº 8.264/2023, selecionou 14 hospitais no Norte de Minas como referência para a profilaxia da transmissão vertical da sífilis, das hepatites virais e do HIV em recém-nascidos. Os critérios foram definidos pelas coordenadorias de Saúde Materno-Infantil, IST/Aids e Hepatites Virais da Secretaria.
As unidades hospitalares selecionadas são:
- Hospital Municipal de Bocaiúva
- Hospital Municipal Senhora Santana, de Brasília de Minas
- Unidade Mista Municipal Dr. Brício de Castro Dourado, de São Francisco
- Hospital Municipal São Vicente de Paulo, de Coração de Jesus
- Hospital Municipal de Francisco Sá
- Fundação de Assistência Social de Janaúba (Fundajan)
- Hospital e Maternidade Nossa Senhora das Graças, de Monte Azul
- Hospital Municipal de Januária
- Hospital Funrural, de Manga
- Santa Casa de Montes Claros
- Hospital Universitário Clemente de Faria, de Montes Claros
- Hospital Dr. Moisés Magalhães Freire, de Pirapora
- Hospital Municipal Dr. Oswaldo Prediliano Santana, de Salinas
- Hospital Santo Antônio, de Taiobeiras
Por Pedro Ricardo
Foto: Pedro Ricardo