A Superintendência Regional de Saúde (SRS) de Montes Claros conclui nesta quinta-feira, 17 de agosto, a realização de curso teórico e prático sobre investigação entomológica da febre maculosa, envolvendo profissionais de dez municípios do Norte de Minas. A iniciativa teve início no dia 15 e conta com a participação de técnicos do Ministério da Saúde (MS) que atuam na Fundação Ezequiel Dias (Funed), sediada em Belo Horizonte. Por meio do Instituto Octávio Magalhães (IOM), a Funed constitui o Laboratório Central de Saúde Pública de Minas Gerais (Lacen-MG).

A febre maculosa é uma doença febril aguda, de gravidade variável, que pode cursar com formas leves e atípicas até formas graves, com elevada taxa de letalidade. A doença é causada por bactérias do gênero Rickettsia e transmitida pela picada de carrapatos infectados. 

Em Minas Gerais, os principais vetores e reservatórios da doença são os carrapatos do gênero Amblyomma (Amblyomma sculptum), também conhecidos como "carrapato estrela", "carrapato de cavalo" ou "rodoleiro". Já o agente etiológico mais frequente é a bactéria Rickettsia rickettsii, responsável por produzir os casos mais graves da doença, aqui denominada Febre Maculosa Brasileira (FMB). 

Profissionais do Norte de Minas aprendem a técnica de coleta de carrapatos com a utilização da técnica de arrasto em áreas de vegetação

Os equídeos, canídeos, roedores como a capivara e marsupiais, como o gambá, têm importante participação no ciclo de transmissão da febre maculosa, podendo atuar como amplificadores de riquétsias e/ou como transportadores de carrapatos potencialmente infectados.

A bióloga e referência técnica do laboratório de entomologia da SRS de Montes Claros, Patrícia Brito, explica que o curso envolve a participação de profissionais que atuam em serviços de campo nos municípios de Montes Claros, Matias Cardoso, Monte Azul, Mato Verde, Francisco Sá, Salinas, Janaúba, Claro dos Poções, Jaíba e Verdelândia. Posteriormente, assim como equipe técnica da SRS Montes Claros, que também participa da capacitação, os profissionais atuarão como multiplicadores dos conhecimentos para os demais municípios do Norte de Minas. 

Além de abordagem teórica sobre a transmissão, sinais, sintomas e diagnóstico laboratorial da febre maculosa, técnicos da Funed estão ministrando aulas práticas em áreas de vegetação, com a coleta de carrapatos no solo com a utilização das técnicas de arrasto e atração de vetores com a utilização de gelo seco. Os profissionais também estão aprendendo a fazer a coleta de carrapatos por meio da busca ativa em equinos, bovinos, ovídeos e canídeos. Nesse caso a aula prática acontece no curral municipal.  

No meio rural, no dia 17 de agosto, técnicos da Funed também vão ministrar aula prática em um sítio localizado às margens do Rio Carrapato. O acondicionamento seguro de carrapatos e encaminhamento de amostras para análise no laboratório da Funed, em Belo Horizonte, também faz parte da capacitação. 

Geovane Pontel, técnico do Ministério da Saúde e referência em entomologia na Funed, observou que “a capacitação de profissionais no Norte de Minas agiliza as investigações da ocorrência de casos de febre maculosa na região, viabilizando com isso o diagnóstico precoce, reduzindo as possibilidades de pacientes evoluírem para situações de saúde mais graves”. 

 

Incidência

A coordenadora de vigilância em saúde da SRS de Montes Claros, Agna Soares da Silva Menezes, destaca a importância da atualização dos profissionais de saúde do Norte de Minas levando em conta que a febre maculosa é uma doença endêmica em Minas Gerais. Embora os casos possam ocorrer durante todo o ano, a doença tem maior incidência no período de estiagem prolongada, entre abril e outubro, quando os vetores se proliferam e estão mais ativos na natureza. 

Dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) apontam que, neste ano, foram confirmados por exame laboratorial 18 casos da doença. Desse total, um caso foi notificado em Montes Claros, num homem de 55 anos de idade, mas que evoluiu para cura. 

Até o momento, neste ano, ocorreram seis óbitos por febre maculosa em Minas Gerais: dois em Manhuaçu; dois em Conselheiro Lafaiete; um no município de Ipaba e um em Divinópolis. Entre 2018 e 2022, foram notificados 190 casos de febre maculosa no estado, com ocorrência de 62 óbitos. 

 “É importante que os municípios fiquem atentos para a notificação e investigação dos casos suspeitos de febre maculosa, isso porque a doença tem sintomas parecidos com a dengue. O diagnóstico deve ser viabilizado por meio sorológico, nos primeiros dias de aparecimento dos sintomas e a investigação dos casos deve levar em conta onde o paciente esteve nas últimas semanas. Os serviços de saúde devem assegurar a assistência necessária aos pacientes, pois a febre maculosa tem altos índices de letalidade”, observa Agna Menezes. 

Entre outras medidas apontadas pela SRS Montes Claros para que os municípios reforcem a vigilância epidemiológica e de saúde contra a febre maculosa estão: a qualificação e o treinamento de médicos e enfermeiros para a suspeição oportuna e assistência aos pacientes; aprimoramento e ampla divulgação dos fluxos assistenciais (manejo clínico, tratamento, vigilância laboratorial, notificação e investigação); qualificação do banco de notificações; intensificação das ações de educação em saúde envolvendo todos os segmentos da população; identificação e monitoramento de áreas de risco e articulação permanente com a Superintendência Regional de Saúde para o desenvolvimento de ações conjuntas.  

 

Sintomas

Os principais sintomas da febre maculosa são: febre; dor de cabeça intensa; náuseas e vômitos; diarreia e dor abdominal; dor muscular constante; inchaço e vermelhidão nas palmas das mãos e sola dos pés; gangrena nos dedos e orelhas; paralisia dos membros que inicia nas pernas e vai subindo até os pulmões causando parada respiratória. 

Além disso, com a evolução da doença é comum o aparecimento de manchas vermelhas nos pulsos e tornozelos, que não coçam, mas que podem aumentar em direção às palmas das mãos, braços ou solas dos pés. Embora seja o sinal clínico mais importante, as manchas vermelhas podem estar ausentes, o que pode dificultar e/ou retardar o diagnóstico e o tratamento, determinando uma maior letalidade.

O diagnóstico pode ser sorológico (padrão ouro) ou por meio da pesquisa direta da riquétsia (bactéria), realizada através de técnicas de imuno-histoquímica, biologia molecular ou isolamento.

 

Tratamento

O tratamento da febre maculosa é realizado com antimicrobianos e deve ser iniciado de forma precoce, nas fases iniciais da doença, como forma de evitar óbitos e complicações. O sucesso do tratamento está diretamente relacionado à precocidade de sua introdução e à especificidade do antimicrobiano prescrito.

Se não tratado, o paciente pode evoluir para um estágio de apatia e confusão mental, com frequentes alterações psicomotoras, chegando ao coma profundo.

 

Prevenção

As principais medidas preventivas na febre maculosa são aquelas voltadas às ações educativas, com vistas ao repasse de orientações à população sobre as características clínicas da doença; unidades de saúde e serviços para atendimento; importância do diagnóstico e tratamento oportunos; áreas de risco e ciclo do vetor.

Para áreas de conhecida infestação por carrapatos ou sob risco de ocorrência de casos recomenda-se:

∙         Uso de repelentes à base da substância Icaridina, que são eficazes na prevenção de picadas por carrapatos; 

∙         Uso de roupas de cor clara, vestimentas longas, calçados fechados (preferencialmente com meias brancas e de cano longo); 

∙         Uso de equipamentos de proteção individual nas atividades ocupacionais (capina e limpeza de pastos); 

∙         Evitar se sentar e deitar em gramados em atividades de lazer como caminhadas, piqueniques, pescarias etc.; 

∙         Examinar o corpo periodicamente, tendo em vista que quanto mais rápido o carrapato for retirado do corpo, menor a chance de infecção; 

∙         Se verificados carrapatos no corpo, retirá-los com leves torções e com o auxílio de pinça, evitando o contato com unhas e o esmagamento do animal; 

∙         Utilização periódica de carrapaticidas em cães, cavalos e bois, conforme recomendações de profissional médico veterinário;

∙         Limpeza e capina periódica de áreas de vegetação passíveis de cuidados.

 

Por Pedro Ricardo

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