A Casa de Saúde São Francisco de Assis (CSSFA) comemora hoje 80 anos de história, repleta de desafios e conquistas. Fundada na cidade de Bambuí, em 23 de março de 1943, com o objetivo de isolar os pacientes portadores de hanseníase, a unidade atualmente tem seu foco voltado para o cuidado integral, intensivo e multidisciplinar dos idosos, muitos deles antigos pacientes.

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“Esses 80 anos representam, além de uma vasta história, um novo marco na sua evolução enquanto unidade de saúde, com a vocação redirecionada para os cuidados integrados aos pacientes, assistidos por uma equipe multidisciplinar, bem estabelecida e reconhecida no seu território” afirma a diretora da CSSFA, Vanessa Cristina Leite da Silveira.

Isolamento

O isolamento dos pacientes nas colônias se deu devido à política sanitarista adotada no Brasil em meados do século passado, que via como única solução separar os portadores da hanseníase (então conhecida como lepra) do convívio familiar e social para evitar que a doença se espalhasse ainda mais, já que ainda não havia nenhum tratamento eficaz.

A então chamada Colônia São Francisco de Assis ficava localizada um pouco afastada da cidade de Bambuí, próxima à linha férrea, e recebia pessoas de todas as idades, acometidas pela doença, enviadas em vagões de trens de ferro das regiões Oeste e Sudoeste de Minas Gerais e do Sul do Goiás.

No entanto, de acordo com as pesquisas já realizadas, apesar de as pessoas viverem trancadas, a colônia também era um lugar de partilha. “Ali tinha cinema, bailes e carnavais, onde as pessoas também tinham seus momentos de diversão”, comenta o servidor Elton Carvalho, que está na unidade desde 2014.

“As contradições faziam parte do dia a dia desses pacientes internados compulsoriamente. Eles viviam a hospitalidade e a hostilidade, as tristezas e as alegrias”, complementa o arquiteto da Fhemig, Sidney Cid, que vem estudando as ex-colônias há mais de uma década.

José Vaz Mendes, o Sr. Juquinha, concorda e disse que deve muito à colônia. “Lá fora eu não saberia como sobreviver. Aprendi muito aqui. Como a roseira que tem os espinhos que machuca, mas tem as rosas com sua beleza e seu perfume, assim é a nossa vida. Acontecem coisas ruins, mas também muitas coisas boas que compensam”.

Liberdade

Em 1977, com a criação da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), a colônia passou a ser administrada pela instituição.

A partir dos anos 1980, a Organização Mundial de Saúde (OMS), começou a recomendar a poliquimioterapia (PQT), deixando, assim, de haver motivo para o isolamento compulsório.

Apesar disso, a maioria dos pacientes optou por continuar na região, devido ao forte preconceito e aos estigmas atrelados à doença, e também por terem perdido o vínculo com seus parentes.

Muitos construíram suas vidas e formaram suas próprias famílias, escrevendo uma nova história. Salvador Pereira da Silva foi um deles. Ele chegou à colônia em 1968, vindo da Bahia e, apesar de tudo, vê a unidade como um local de salvação. “Aqui encontrei a assistência adequada e o apoio dos ‘irmãos hansenianos’. Foi onde formei minha família e vivo feliz até os dias de hoje”, diz emocionado.

Revocação

Em 2007, a unidade passou a se chamar Casa de Saúde São Francisco de Assis (CSSFA) e teve seu papel assistencial redefinido no Sistema Único de Saúde (SUS), tornando-se hospital de referência regional em reabilitação e atenção ao idoso.

Para o servidor João Batista Anésio Filho, que trabalha no local há 37 anos, a Casa de Saúde significa um verdadeiro lar, onde ele cresceu, lutou contra o preconceito, conheceu sua esposa e fez amigos. “Tive a oportunidade de ajudar quem precisava e acompanhar o crescimento da da unidade, que vai além de um hospital. É um lugar acolhedor, com muito verde e belos jardins”, elogia.

A aposentada Leila Maria Silva Araujo também dedicou muitos anos de trabalho à unidade. “Tive a satisfação de me aposentar com uma valiosa bagagem profissional e pessoal, após quase 32 anos de atuação na área administrativa da CSSFA. Criei laços com colegas, pacientes e toda a comunidade, além dos saudosos padre Mário Gerlin e a irmã Carmela. A unidade merece muitos aplausos pelos seus 80 anos de assistência prestada, superando as dificuldades e transformando a vida de muita gente”.

Benfeitorias

O padre italiano Mário Gerlin, junto às irmãs do Monte Calvário, coordenadas pela também italiana Irmã Carmela, tiveram um papel fundamental na história da casa de saúde, com inúmeras ações de humanização e valorização da vida.

Entre elas, as muitas melhorias estruturais na unidade, a abertura da creche e de escolas na região e, talvez, a mais marcante: o reencontro promovido entre os ex-hansenianos e seus filhos, que na época da internação compulsória eram levados para longe dos pais como parte das medidas de combate à proliferação da hanseníase.

Lázaro Marciano, o Sr. Lazinho, foi uma dessas crianças. Em 1955, eles vieram para a colônia após seus pais serem diagnosticados com hanseníase. “Cheguei aos 9 anos e fui morar no porão com a Dona Ana, que cuidava dos recém-nascidos até serem enviados ao preventório. Foi muito difícil, pois eu era muito apegado à minha mãe. Então, a Dona Ana acabou suprindo essa falta”, conta ele, que anos depois virou cozinheiro da CSSFA, chegando à função de motorista, na qual permaneceu até se aposentar.

Hoje

Atualmente, a CSSFA conta com três leitos de clínica médica e 50 leitos na Unidade de Cuidados Prolongados (UCP) especializados em reabilitação multiprofissional, integral e intensiva dos usuários do SUS, para retaguarda da rede de urgência e emergência da macrorregião Oeste do estado.

Além disso, oferece atendimento asilar a 107 usuários da linha de cuidado das pessoas atingidas pela hanseníase, 30 em lares inclusivos e 77 em atendimento domiciliar.

Entre os serviços prestados, estão: internação na UCP e na clínica médica, assistência ambulatorial à linha de cuidado ao idoso (residências e lares inclusivos), ambulatórios de reabilitação e de lesões, exames de apoio (ultrassom, raio-X e eletrocardiograma) e sapataria ortopédica.

Os serviços são destinados aos usuários com sequelas decorrentes de atendimento clínico, cirúrgico ou traumatológico, e que necessitam de reabilitação.

Por Aline Castro Alves

Por ASCOM Fhemig