Setembro chegou e é hora de lembrar ainda mais sobre a importância da doação de órgãos, especialmente neste momento em que houve uma queda de cerca de 27%, no primeiro semestre, em comparação ao mesmo período do ano passado. De acordo com dados do MG Transplantes, de janeiro a agosto deste ano foram doadas 363 córneas, 43 escleras, 127 medulas ósseas, 340 rins, 32 corações, 6 fígados/rins, 88 fígados, 11 rins/pâncreas e 3 pâncreas. Um total de 1013 órgãos. Um número bem abaixo do ano passado quando, no mesmo período, foram realizadas 1539 doações. A queda em Minas Gerais, no entanto, é bem menos expressiva que em outros estados do país, como os das regiões Norte e Nordeste.

Segundo o diretor do MG Transplantes (responsável por coordenar a política de transplantes de órgão e tecidos em Minas Gerais), Omar Lopes Cançado Junior, o baixo número de doações coincide exatamente com o período da pandemia do coronavírus. “O afastamentos social impediu as pessoas de saírem às ruas e, com isso, refletiu na diminuição do número de acidentes e traumas em 45%, além das pessoas terem contraído menos doenças em geral”. Ele explica, ainda, que muitos possíveis doadores tiveram que ser excluídos. “Pessoas com qualquer suspeita de doença respiratória eram, automaticamente, excluídas da possibilidade de ser doador, independentemente do quadro ter sido relacionado à Covid-19”.

Desafios

O Brasil possui o maior sistema público de transplantes no mundo, sendo responsável, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), pelo financiamento de cerca de 92% dos procedimentos. Além disso, o País é o segundo em número absoluto de transplantes, ficando atrás somente dos Estados Unidos.

No entanto, os números poderiam ser ainda melhores se os familiares autorizassem as doações. Atualmente, cerca de 30% das famílias recusam a retirada de órgãos para a doação. No Brasil, só quem pode autorizar a doação de órgãos são os parentes até segundo grau, ou seja: pai ou mãe, filhos, avós, netos ou cônjuges. “Por isso, é tão importante expressar, para os parentes mais próximos, a vontade de ser um doador”, afirma Omar.

Além da autorização familiar, algumas outras questões também podem dificultar a doação, como explica o diretor. “Além da solidariedade das pessoas para autorizarem a doação, os principais desafios no processo são a identificação de possíveis doadores nos hospitais e a realização do protocolo de morte encefálica. Além disso, neste momento da pandemia, é necessária a realização de uma série de exames para evitar a transmissão do coronavírus”.

Campanha

O Dia Nacional de Doação de Órgãos, comemorado no dia 27 setembro e a campanha Setembro Verde podem ajudar nesse processo. “A campanha é importante exatamente para conscientizar e sensibilizar a população sobre a necessidade da doação de órgãos e fazê-las conversar sobre o assunto com sua família e seus amigos, afinal uma única pessoa pode salvar, ou melhorar, a qualidade de vida de até 11 pessoas que estão na fila de espera por um órgão. Se acrescentarmos os tecidos como pele, ossos, tendões e valvas cardíacas, esse número sobe para dezenas”, ressalta o diretor do MG Transplantes. Isso porque, no caso de doador falecido, podem ser retirados para transplante até dois rins, dois pulmões, duas córneas, intestino, fígado, pâncreas, coração, pele, ossos e tendões.
Atualmente, 4.572 pessoas aguardam na fila para realizar o transplante de algum órgão, em Minas Gerais. A maior espera é para o transplante de rim, com 2863 pessoas na fila, seguida pelos 1545 pacientes que necessitam de córnea e pelos 53 que aguardam transplante de fígado.

Vida nova

Valter Gonçalves Franco, de 70 anos, precisou de um transplante depois de contrair xistose e, em seguida, hepatite b e cirrose. Ficou em tratamento por quatro anos e quase 8 meses na fila de espera por um órgão, que acabou conseguindo em 2017. “Fiquei muito satisfeito, pois voltei a me sentir bem. Porém, após 1 ano e três meses, tive um problema na via biliar e acabei necessitando de um novo transplante, após tentar alguns procedimentos que não deram resultado. Desta vez, aguardei 15 dias na fila e fui transplantado em fevereiro deste ano. Agora, me sinto muito bem novamente, feliz, ganhei peso e não sinto mais nenhum mal estar”, conta ele que diz que o principal é não desistir. “Quem está guardando na fila deve ter fé e paciência, que vai dar tudo certo”.

Deu certo também para João Pereira de Magalhães, 67 anos, transplantado de córnea há mais de 11. Ele conta a sua experiência e se diz muito satisfeito com o resultado. “Sou portador de ceratocone (alterações na transparência e curvatura da córnea que podem comprometer a visão) e precisei fazer o transplante de córnea. A cirurgia foi um sucesso. Antes, eu tinha 12 graus de miopia, hoje tenho apenas 1,75. Minha qualidade de vida melhorou muito”, conta.

Ele ainda aproveita para chamar atenção dos familiares para uma reflexão. “Os familiares que não autorizam a doação dos órgãos do seu ente querido devem pensar que aquele órgão será perdido, não terá mais utilidade. No entanto, quando as famílias têm a generosidade de autorizar a doação, ela estará perpetuando a vida daquele indivíduo, fazendo com que ele dê sua contribuição à sociedade, à humanidade, melhorando a qualidade de vida de muitas pessoas e até salvando vidas”.

Por Aline Castro Alves

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