O Brasil é um dos países do mundo com o maior número de pessoas infectadas com o vírus HTLV (vírus linfotrópico da célula T humana), que pode causar doenças graves, como a mielopatia (doença neurodegenerativa que provoca fraqueza nas pernas, causando dificuldades para andar, podendo levar à paralisia nos casos mais graves) e a leucemia (câncer que ocorre na formação das células sanguíneas, dificultando a capacidade do organismo de combater infecções).

Além dessas doenças graves, o vírus também pode causar outros problemas de saúde, como doenças de pele, dores nos membros inferiores (panturrilhas), na região lombar (parte inferior da coluna lombar), dificuldade de defecação ou micção. Os sintomas que o HTLV provoca são progressivos e são sentidos, em geral, na região abaixo da linha do umbigo. As doenças associadas ao vírus geralmente aparecem após os 40 anos, mas podem surgir antes.

Crédito: Divulgação Hemominas

Embora descoberto há mais de 30 anos, o HTLV é ainda pouco conhecido pela população em geral e até mesmo pelos profissionais de saúde, o que leva à dificuldade de diagnóstico e, consequentemente, a uma maior disseminação do vírus. “Infelizmente, muitos portadores do vírus HTLV não sabem que estão infectados, e podem transmitir o vírus para outras pessoas. Como não há tratamento para eliminar o vírus, é preciso conter a transmissão da infecção, que pode se dar pela relação sexual sem proteção; pelo contato com sangue contaminado através do compartilhamento de agulhas e seringas; e da mãe infectada para o bebê, via amamentação”, explica a professora da Faculdade de Medicina da UFMG, Denise Utsch. Ela esclareceu, também, que não se contrai o HTLV compartilhando alicates de unha, por exemplo, embora essa seja uma das formas de transmissão de outras doenças sérias, como a hepatite.

De acordo com a professora do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Edel Stancioli, o vírus HTLV é considerado uma infecção negligenciada no mundo. “Não há aporte financeiro para a pesquisa e não há uma resposta coordenada de Saúde Pública, ou seja, não há tratamento uniforme para os portadores do HTLV. Muitas vezes o paciente é triado, mas não se fecha o diagnóstico porque as áreas afetadas podem ser variadas. Além disso, temos poucos Centros de Referências para tratamento do portador. Sem investimentos não conseguimos avançar nas pesquisas e muitas informações sobre o HTLV ainda são desconhecidas. E essa é a realidade que precisamos mudar. Num futuro próximo, esperamos conseguir desenvolver vacinas terapêuticas para tratar as pessoas”, afirmou.

Testes para HTLV e tratamento

Em 2008 foi promulgada, pelo Governo de Minas Gerais, a Lei 17344, que torna obrigatória a realização de testes sorológicos para o diagnóstico da infecção pelo vírus HTLV e o tratamento dos casos identificados. No Brasil, o teste para HTLV é obrigatório em todos os bancos de sangue para evitar a contaminação via transfusão sanguínea.

Como há altas taxas de prevalência do HTLV entre grupos familiares, é importante que, se uma pessoa da família for portadora do vírus, todas as outras façam o teste para saber se também possuem o vírus. “Conhecer o diagnóstico é o primeiro passo para que a pessoa infectada possa receber uma assistência médica adequada para o controle dos sintomas e garantir uma melhor qualidade de vida”, afirma a professora da Faculdade de Medicina da UFMG, Júlia Caporali.

A professora também ressalta a importância de se modificar o hábito nas relações sexuais. “Devemos usar preservativos em todas as relações sexuais. E quando mantemos parceiros fixos, com quem não usamos preservativos, devemos fazer testes sorológicos periodicamente, por que ele(a) ou nós podemos desconhecer que temos determinado vírus, por causa da janela imunológica que varia de doença para doença. Para quem tem parceiros casuais essas medidas são imprescindíveis”, adverte.

Em Belo Horizonte, existem dois Centros de Referência para o tratamento do vírus HTLV: o Centro de Treinamento e Referência em Doenças Infecto-Parasitárias (CTR/DIP Orestes Diniz) e o Hospital Eduardo de Menezes. “O CTR Orestes Diniz é uma parceria da Prefeitura de Belo Horizonte com o Hospital das Clínicas. O laboratório especializado em HTLV funciona uma vez por semana e recebe os encaminhamentos da Prefeitura de Belo Horizonte, da Hemominas e do Hospital das Clínicas. O laboratório do Hospital Eduardo de Menezes, da rede Fhemig, também funciona uma vez por semana e segue o fluxo da Regulação, assim como o Orestes Diniz”, explica.

Dia Mundial do HTLV

Para chamar a atenção das pessoas para a importância do diagnóstico, foi instituído o Dia Mundial do HTLV, que passa a ser lembrado em 10 de novembro. Para marcar a data, o Grupo Cuidar HTLV e o GIPH (Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em HTLV) promoveram um Ato Público na Faculdade de Medicina da UFMG, na manhã do último sábado (10/11). “Essa é a forma que achamos para chamar a atenção para o problema de saúde pública que o vírus representa. Vamos juntos lutar pelo acesso ao diagnóstico do HTLV, pela assistência médica das pessoas vivendo com HTLV e pela tomada de medidas para prevenção da infecção”, explica Marina Lobato, pesquisadora da Fundação Hemominas e integrante do GIPH.

Durante a programação foram discutidos temas como a história do HTLV em Minas Gerais e no Brasil; os avanços, desafios e perspectivas futuras com relação à pesquisa sobre o vírus; o que as pessoas podem fazer para se prevenir do contágio pelo vírus HTLV; e a assistência prestada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em Minas Gerais aos portadores do vírus. Estiveram presentes na ação mais de 50 pessoas, entre pesquisadores, estudantes, profissionais da saúde, portadores de HTLV e seus familiares.

Durante o Ato, também foi ressaltada a necessidade da união dos portadores do HTLV para dar visibilidade ao problema e conseguir avanços nas Políticas Públicas de Saúde. Foram citadas as duas associações de portadores do HTLV existentes no Brasil: Grupo Vitamore (RJ) e Grupo HTLVida (BA). “Toda a visibilidade do HIV se deu graças à luta dos portadores da Aids. É preciso a mesma coragem e envolvimento das pessoas que convivem com o vírus HTLV para que se consigam avanços semelhantes”, acredita a professora da Faculdade de Medicina Júlia Caporali. “Vocês são nossos multiplicadores do conhecimento em HTLV”, completa Denise Utsch, professora da Faculdade de Medicina da UFMG. Abaixo, assista uma reportagem da TV UFMG sobre o HTL:

 

Por Silvane Cruz / Hemominas