“Acho muito importante a participação da mulher nas pesquisas científicas, sem desfazer dos homens, mas as mulheres são muito criteriosas e dedicadas. Acho que tem espaço tanto para os homens quanto para as mulheres, pois os dois juntos podem fazer muito para a Ciência”. É com essa sabedoria que a pesquisadora bioquímica da Fundação Ezequiel Dias (Funed), Marta Nascimento Cordeiro, enxerga um mundo científico mais inclusivo, com mais espaço para as mulheres.

Servidora da Fundação, Drª Marta, como é conhecida pelos colegas, mesmo depois da aposentadoria segue se dedicando às pesquisas relacionadas ao veneno da aranha armadeira, a Phoneutria nigriventer. São mais de 30 anos da carreira de pesquisadora dedicados aos laboratórios da Funed, período de sua história que se entrelaçou às vidas de outros pesquisadores, entre eles a do professor Carlos Ribeiro Diniz. Hoje, Drª Marta segue na Fundação como um exemplo mostrando que o trabalho dela e de tantas outras mulheres tem da relevância para o mundo da Ciência.

O caminhão do Programa Ciência em Movimento (PCM), da Funed, seguiu viagem nesta semana para o município de Belo Vale, cidade natal da Drª Marta. No Dia Internacional da Mulher, o PCM e a Prefeitura de Belo Vale prestam uma homenagem à pesquisadora, mostrando à população da cidade o trabalho de destaque que vem sendo desenvolvido ao longo destes anos com a pesquisa do veneno da aranha armadeira.

A trajetória

Drª Marta percorreu um longo caminho que a levaria ao mundo da Ciência. Na infância, possuía uma vida itinerante com os pais, Antônio e Celina, e com os 13 irmãos. “Morei por pouco tempo em Belo Vale já que meu pai era ferroviário e nós vivíamos mudando de uma cidade para outra”, conta. Os estudos começaram em Belo Vale mesmo, em uma escola no Arrojado de Lisboa e depois na Escola Abílio Machado. “Eu ficava na casa de parentes, ia à escola pela manhã e à tarde tinha reforço, com a mesma professora da escola”, relembra.

O primeiro contato com a Biologia aconteceu nos primeiros anos de escola, nas aulas de Ciências. A pesquisadora relata que sempre foi muito curiosa e assim que se mudou para Belo Horizonte. Já na Escola de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), enquanto cursava Bioquímica, o mestrado e o doutorado em Bioquímica e Imunologia, pôde saciar toda a sede de conhecimento que desde sempre a acompanhou.

Carlos Ribeiro Diniz

Drª Marta foi convidada pelo professor Carlos Ribeiro Diniz para dar andamento às suas pesquisas na Funed. “O professor Diniz tinha intenção de voltar a trabalhar com o veneno da aranha Phoneutria nigriventer para saber quais os componentes deste veneno induziam sintomas específicos nos indivíduos que tinham sidos picados. Em uma tarde de 1987, o professor Diniz me chamou em seu escritório e perguntou se eu aceitava um desafio. Respondi que aceitava, topei e estou nessa até hoje”, conta.

O grupo que trabalhava com este veneno nos laboratórios da Funed – que no final da década de 1980 se chamava Centro de Pesquisa e Desenvolvimento e, mais tarde, foi denominado Estudo Bioquímico de Venenos Animais – incluía o estudo do veneno das serpentes, escorpiões e aranhas. Foi nessa época que o projeto de pesquisa passou a contar com a colaboração técnico-científica de outras instituições como a Rede Mineira de Toxinas com Atividade Terapêutica, no Instituto de Ensino e Pesquisa da Santa Casa de Belo Horizonte, onde são realizados os estudos farmacológicos das toxinas do veneno da aranha Phoneutria nigriventer e da UFMG, que incorporou ao projeto a Drª Maria Elena Lima, que fez a parte biológica da pesquisa.

Trabalho de pesquisa

A pesquisa que envolve o veneno da aranha Phoneutria nigriventer busca moléculas do veneno que têm atividade terapêutica, para o desenvolvimento, por exemplo, de novos medicamentos para impotência sexual. Por meio de experimentos em animais, foi possível descobrir qual era a fração que continha o componente que induz a ereção involuntária do pênis. Em colaboração com as doutoras Maria Elena Lima e Carolina Nunes, da UFMG esta substância foi sintetizada ao ponto de não produzir efeitos colaterais.

Os trabalhos de purificação e caracterização bioquímica da toxina do veneno, realizados na Funed, e a síntese de parte da toxina, bem como os estudos farmacológicos realizados na UFMG, resultaram no depósito de uma patente, que foi transferida para a indústria, com o objetivo de desenvolver o medicamento.

Existe ainda a possibilidade de utilizar outra toxina do veneno como um potente analgésico. “Pesquisas como esta, desenvolvidas na Funed e por seus colaboradores, são importantes para o avanço do conhecimento beneficiando a sociedade e o país”, esclarece a pesquisadora que, atualmente, desenvolve seus trabalhos no Serviço de Bioquímica e Proteínas Venenos Animais, da Funed.

Dedicação à Ciência

Dedicar à vida a pesquisa científica e às descobertas que influenciam o bem-estar social sempre nortearam o trabalho da Drª Marta. Para ela, viver no mundo da ciência é sempre muito mais instigante. “Não se tem limites dentro da pesquisa, sempre tem algo a ser feito e algo novo. Para se trabalhar na pesquisa é preciso querer, gostar do que faz e se dedicar. Basta escolher o campo de pesquisa, que são vários, não é? Se não tiver dedicação, não adianta”, adverte a pesquisadora.

 

Por Luciane Marazzi / FUNED

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