Na última quinta-feira (22/02), a Escola de Saúde Pública do Estado de Minas Gerais (ESP-MG) realizou mais uma edição dos seminários em saúde pública, desta vez com o tema "Imigração e os Desafios para a Saúde Pública".

A atividade abordou a importância da qualificação dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) para o atendimento a imigrantes, além das melhorias necessárias na infraestrutura e financiamento dos centros de saúde, o conceito de terminologias importantes, como imigração, apátridas, migrantes, refugiados, dentre outras.

 
As barreiras no acolhimento

Para Juliana Miranda, advogada do Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados (Centro Zanmi), os desafios da imigração não estão relacionados à legislação do país, que garante direitos a essa população, mas o acesso a esses direitos e a qualificação dos profissionais de saúde para acolherem a população imigrante. “Uma das principais barreiras para o acolhimento dos imigrantes é a barreira linguística, pois o imigrante na maior parte das vezes chega sem saber falar o português, além de não haver a figura de um intérprete público. Do outro lado, os trabalhadores do SUS farão um esforço para tentar entendê-los, seja por meio de ferramentas que possam ajudar nisso, como tradutores”, explica.

Ela também enfatiza a dificuldade no atendimento devido à falta de informação sobre os procedimentos com as documentações e sua legitimidade no país. “Muitos imigrantes chegam com documentos diferentes dos brasileiros, e trabalhador não sabe se há validade no território nacional, se o documento atesta que o imigrante está regular ou irregular, ou ainda, se o imigrante irregular tem direito a acessar o SUS. Nesse sentido é interessante reforçar a qualificação para que possamos manter esse diálogo, informar e responder às demandas”, destaca.

A pedagoga do Coletivo de Mulheres Migrantes (Cio da Terra), Luciana Pereira, abordou a humanização no atendimento como estímulo para ultrapassar barreiras do Sistema. “O mais importante que temos hoje é o espaço para diálogo, pois todos aqui já atuam na área da saúde. O diálogo é importante, pois há o medo do desconhecido, do estrangeiro que é diferente, temos que romper essa barreira. A ideia é que possamos valorizar o lado humano desse espaço em detrimento dos medos, receios e barreiras que colocamos no atendimento aos usuários”, disse.

Palestrantes convidadas e o diretor-geral da ESP-MG, Edvalth Rodrigues Pereira.

Escravidão moderna

Os desafios da inserção social, a qualidade no atendimento do SUS a imigrantes e as condições de trabalho na saúde pública foram um dos pontos destacados pela professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Jandira Maciel, que enfatizou estas relações como empasses para melhoria da saúde pública. “O mais importante é reconhecer e trazer para suas práticas de saúde pública a dimensão do trabalho como processo saúde-doença dos indivíduos e das coletividades. O SUS e seus trabalhadores têm muitas dificuldades e limitações nesse reconhecimento, como falta de formação, compreensão, entendimento e deliberação para implantar essa questão. Cobrar dos profissionais e implantar a política nacional de saúde do trabalhador e da trabalhadora nos diversos setores e níveis do SUS é necessário, afirmou. 

A professora destacou ainda a importância de entender os processos de trabalho que estes imigrantes estão sujeitos, e sua influência na garantia do atendimento no SUS. “Na maioria das vezes a força de trabalho do imigrante está relacionado com o trabalho análogo à escravidão, em que esse indivíduo sai para trabalhar e muitas vezes é capturado no seu espaço de trabalho para ser usado em situações degradantes que não permitem o crescimento material, espiritual, subjetivo dos nossos trabalhadores”, enfatizou.

Prática no SUS

Miriam Ávila, Diretora da Atenção Primária na Saúde no município de Rosário da Limeira (Zona da Mata) e aluna da especialização em Saúde Pública da ESP-MG, o tema aponta para a importância de um planejamento estratégico para garantir o atendimento de qualidade e o cumprimento das demandas das unidades de saúde. “O debate foi muito produtivo, pois temos que nos preparar para o atendimento dessas pessoas e ainda pensar na parte financeira”, diz.

Natália de Oliveira, que atua na Gerência de Assistência, Epidemiologia e Regulação da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e também aluna do curso, destaca a importância da qualificação dos trabalhadores do SUS para garantir a implementação da missão do Sistema. “Trabalhar no SUS é sempre um grande desafio. Nossa política de garantir a universalidade, a equidade, a integralidade do cuidado a todos é algo bem desafiador. Se tratando dos migrantes e imigrantes é muito mais intenso, justamente por eles não terem uma política nacional”, afirmou.

 
Dados

No Brasil, mesmo sem uma base unificada de registros de imigrações, dados de 2017 do Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) mostram aumento anual do número de imigrantes no país, sendo os haitianos o principal grupo, seguido pelos bolivianos, chilenos, angolanos, senegaleses e mais recentemente, venezuelanos em Roraima.

A predominância é de imigrantes do sexo masculino, com exceção para os chineses que em sua maioria são do sexo feminino. Os estados que mais recebem imigrantes são São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná.

Os seminários

Os seminários são atividades do curso de especialização em Saúde Pública da ESP-MG que abordam temas de grande relevância no campo da saúde pública, saúde coletiva e do SUS, promovendo momentos de interação entre alunos e trabalhadores da instituição e público em geral.

 

Por Ayrá Sol Soares / ESP-MG